sexta-feira, 7 de julho de 2017

Professor de Educação Especial, quem és tu?

São normalmente duas as frases que oiço quando digo a minha profissão.
“- Professora de Educação Especial? O que fazes exatamente?”
“- Ah, isso é um grande desafio! Tens de trabalhar com casos complicados, autistas e isso..”
Existe efetivamente, não só quem não é do núcleo da Educação, quem ainda não compreende exatamente o que faz um professor de Educação Especial. Esta é uma atitude resultante da multiplicidade de papéis que os professores nesta área têm assumido dependendo das instituições/escolas onde estão inseridos; da sua base de formação e em última instância do perfil de cada um. Há no entanto, como em todas as profissões uma definição de funções comuns.
 O “boom” da especialização em Educação Especial teve início após o enquadramento legal que apela à inclusão não permitindo que escolas regulares vedem o acesso a crianças com Necessidades Educativas Especiais (NEE).
A especialização de um professor na área de Educação Especial está ao alcance de todos os professores. Atualmente existem várias ofertas e como em todas as áreas, algumas mais adequadas do que outras. Tão importante como a especialização nesta área estão, sem dúvida, as experiências e os locais por onde passou o professor de Educação Especial. Estes fatores, “em colaboração” com os conhecimentos académicos é que permitem fazer a diferença.
Um professor de Educação Especial deve conhecer todo o enquadramento legal relativamente às necessidades educativas especiais, conhecendo na íntegra o Decreto. Lei 3/2008, o documento orientador que regula a intervenção nas Necessidades Educativas Especiais. É o Departamento de Educação Especial que recebe as referenciações (onde deve estar integrado um relatório médico) dos alunos que revelam dificuldades nas atividades e participação em sala de aula, avaliando, conjuntamente com o SPO (Serviço de Psicologia e Orientação) o perfil de funcionalidade do aluno através de uma avaliação pedagógica (professor EE) complementada com uma avaliação psicológica, (Psicólogo). Após esta avaliação o professor EE propõe as medidas educativas que em conjunto com as informações do conselho de turma são definidas através de um Programa Educativo Individual. Identificadas as áreas comprometidas e as áreas fortes (emergentes) o professor de Educação Especial funciona como um intermediário que tem de conhecer os comprometimentos avaliados pelos profissionais de saúde e as suas implicações nas aprendizagens. É o professor EE que pode ajudar os professores do conselho de turma com ferramentas e estratégias que permitem ajudar o aluno no seu percurso. É o aliado para discutir, planear e orientar a intervenção mais adequada. Tem também um papel fundamental para explicitar à comunidade escolar não só o enquadramento legal, mas a filosofia subjacente nas necessidades educativas especiais para que todos os intervenientes usem uma linguagem universal e uma postura congruente, nunca nos esquecendo do nosso papel, mas interligando conhecimentos. Encontrar as ferramentas mais indicadas e com rigor para ajudar o aluno a atingir as metas trabalhando em conjunto com os professores e individualmente com o aluno é o seu objetivo.
“Rigor” é uma palavra fundamental. Fundamental para definir, também, o que não é Educação Especial. Não é um espaço para explicações, não é uma sala de apoio às disciplinas, não é um professor de apoio sócio educativo e não é o médico de família do Ministério da Educação que transpõe para um papel, em modo de medida educativa, as indicações do relatório médico do aluno.
É importante percebemos o papel de cada um neste processo. Os profissionais de saúde são fundamentais para indicarem o perfil de funcionalidade ao nível das estruturas do corpo e nas funções mentais, mas não podem receitar medidas educativas, assim como um professor de educação especial não receita medicamentos, porque não é a sua área.
Em suma, o Departamento de Educação Especial tem de possuir conhecimentos consistentes relativamente a todas as áreas de intervenção, Tem de conhecer as fragilidades, as perturbações do desenvolvimento e tem de dominar as ferramentas mais indicadas para trabalhar competências específicas que permitam ao aluno encontrar uma forma de estabelecer um ponto de partida que o coloque o mais possível em igualdade de circunstâncias.
Cada alínea de cada medida educativa tem de ser pensada, repensada, especificada e nunca, nunca generalizada ou massificada. Os alunos não são rótulos. São nomes, vidas e personalidades diferentes que para progredirem no seu percurso têm de ser respeitados. E por isso defendo que existe um perfil para se ser Professor de Educação Especial. Por experiência própria reconheço que é difícil manter uma linha de intervenção e objetivos claros quando em muitas escolas o Professor de Educação Especial acaba por ser o único recurso de apoio boicotando assim o seu verdadeiro trabalho.
Em última análise (que deve ser geral a todos os professores), em Educação Especial é necessário um trabalho de um grande envolvimento, de pesquisa constante e especial em estabelecer uma relação com os alunos que lhes transmita confiança verdadeira, pois facilmente a nossa postura pode soar a falso se não é sentida. E só a partir deste ponto é possível desenvolver um trabalho.
In Comregras

Descoberta mutação genética que causa doença neurodegenerativa hereditária

Cérebro de um doente com ataxia hereditária SCA37. O cerebelo é a região mais comprometida nesta doença I3S
Uma equipa de investigadores portugueses do i3S (Instituto de Investigação e Inovação em Saúde, no Porto) identificou a alteração genética que causa uma doença neurodegenerativa incurável que, para já, só foi diagnosticada em famílias portuguesas das regiões do Sul do país. Num artigo publicado esta quinta-feira na revista científica American Journal of Human Genetics, os cientistas explicam onde encontraram o “erro” que desencadeia a doença. Está no cromossoma 1, num gene chamado DAB1. Agora, “só” falta encontrar uma forma de o corrigir.

Os sintomas da doença aparecem já na idade adulta mas são fortemente incapacitantes, afetando o movimento e a coordenação e progressivamente dificultando a execução de simples tarefas como andar, falar, engolir ou escrever. É uma doença neurodegenerativa rara incurável que faz parte da família das ataxias espinocerebelares (SCA, do inglês spinocerebellar ataxia), com uma prevalência de quatro em cada 100 mil habitantes. Neste caso, trata-se da SCA37 que é clinicamente muito parecida com a doença Machado-Joseph, a ataxia hereditária mais comum em Portugal. No caso da Machado-Joseph, a mutação já está identificada e foi encontrada num outro gene e num outro cromossoma.

Agora, e passados dez anos de investigação, a equipa do i3S encontrou o “erro” que causa a SCA37. Para explicar a descoberta de uma forma simplista, olhe para o gene DAB1 (que, diga-se de passagem, é um dos maiores genes do genoma humano e é responsável pelo desenvolvimento neurológico durante a fase embrionária) como uma palavra com várias letras. Uma pessoa saudável tem neste gene algo como ATTT. O que os cientistas perceberam é que num doente com esta ataxia hereditária este gene tem não só uma repetição desta sequência várias vezes (ATTT) como também tem uma letra (um C, por exemplo) a mais. Este erro “é tóxico”, explica a coordenadora do estudo, Isabel Silveira, do Grupo de Genética da Disfunção Cognitiva do i3S.

Para comprovar a “toxicidade” do erro encontrado nesta palavra, os investigadores introduziram a sequência alterada num embrião do peixe-zebra (um modelo animal frequentemente usado em estudos genéticos). “O que vimos foi o aparecimento de malformações graves e uma baixa taxa de sobrevivência dos embriões, o que provou que a sequência era tóxica.”

Aliás, segundo concluíram, o “erro” pode até agravar-se em determinadas situações. Por exemplo, quando esta mutação é transmitida aos filhos (e há 50% de probabilidade de acontecer), o tamanho da sequência alterada aumenta, sobretudo se o portador da doença for o pai. E quando o “erro” é maior, os sintomas da doença são mais precoces e mais graves, concluíram ainda.

Os investigadores acompanharam três grandes famílias e três mais pequenas do Sul de Portugal, particularmente da região do Alentejo, onde foram identificados 41 doentes. “O acompanhamento destas famílias foi essencial para perceber os efeitos da doença de geração para geração”, refere (...) Isabel Silveira. A frequência desta doença rara é elevada no Sul do país mas a cientista acredita que “a causa genética agora descrita poderá estar também na origem da condição clínica de indivíduos de famílias de outras origens geográficas, nomeadamente algumas famílias espanholas que clinicamente estavam descritos como possuindo a SCA37, mas cuja causa genética ainda não é conhecida”.

O estudo, explica a cientista, permitiu o desenvolvimento de um novo teste genético que deverá “alargar as possibilidades de diagnóstico e aconselhamento genético a familiares mesmo antes dos sintomas da doença aparecerem”. Abre-se também a possibilidade de usar este conhecimento sobre a mutação para futuro diagnóstico genético pré-implantatório que poderia permitir escolher os embriões saudáveis e evitar o desenvolvimento da doença.

Mas, para já, o próximo passo é tentar reparar o erro em doentes, encontrando soluções que permitam (pelo menos) abrandar a progressão da doença. “Vamos tentar perceber de que forma esta alteração causa esta toxicidade, porque ainda desconhecemos o mecanismo, e vamos também tentar ver se encontramos alguma biomolécula capaz de bloquear este erro. Vamos primeiro fazer experiências com linhas celulares e peixes-zebra. Isso é fundamental para encontrar alvos para o tratamento.” Ou seja, é necessário perceber como é que este “erro” funciona, que mecanismos e efeitos são desencadeados e como isso acontece, para depois bloquear as letras que estão a mais neste gene e fazer com que o nosso organismo leia aqui (no gene DAB1) uma palavra bem escrita, sem elementos tóxicos.

In PUBLICO