Ministério põe novas condições para a redução de turmas com alunos com NEE e justifica alteração com a necessidade de "induzir mais inclusão".
O Ministério da Educação (ME) não só não diminuiu o número de alunos por sala, como defendido no programa do Governo, como tornou mais difícil a redução das turmas que incluam alunos com Necessidades Educativas Especiais (NEE). É o que resulta do despacho que estabelece as regras sobre as matrículas e a constituição de turmas no próximo ano lectivo, publicado nesta quinta-feira em Diário da República.
Neste diploma determina-se que a redução das turmas com alunos com NEE só se poderá concretizar se estes permanecerem nas salas de aula “pelo menos 60% do seu tempo curricular”, o que será válido desde o pré-escolar até ao 3.º ciclo. Muitos dos estudantes com NEE precisam de apoios especializados que são prestados fora da sala de aula. Até agora, as turmas com estudantes com NEE só poderiam ter um total de 20 alunos, não havendo outros critérios para que esta redução se efectivasse. O objetivo é o de garantir que os professores tenham mais disponibilidade para acompanhar estes alunos, no seu ritmo.
Para o professor de educação especial e autor do blogue Incluso, João Adelino Santos, a nova condição imposta pelo ME é "uma medida puramente administrativa para limitar ao máximo a constituição das designadas turmas reduzidas”. Em resposta ao PÚBLICO por e-mail, este docente diz também que se “trata uma medida hipócrita porque continua a encarar os alunos como um ‘número’, em vez de os considerar enquanto pessoas, ainda que com limitações e singularidades, mas com necessidades ao nível da organização da turma”. “Os assuntos educativos devem ser encarados com humanismo, sobretudo aqueles que se referem a alunos já por si fragilizados e mais vulneráveis”, defende.
"Mais inclusão"?
Num esclarecimento enviado ao PÚBLICO, o Ministério da Educação afirma que a alteração nas condições para a redução de turmas tem “um único objectivo”, que é o de “induzir mais inclusão”.O ME refere, a propósito, que se “tem constatado, e isso tem sido sinalizado por vários responsáveis do setor da Educação Especial, que há alunos com NEE que são sistematicamente excluídos da sala de aula, passando a maior parte do seu tempo em unidades de apoio e não em contacto com os seus colegas e professores”. Por essa razão, considerou que era necessário “induzir mais inclusão, associando a redução do número de alunos ao estímulo à permanência destes alunos com a turma”.
“Um aluno pode não estar 60% integrado na turma mas, no restante, pode requerer um apoio individualizado por parte do docente da disciplina, implicando, assim, redução de turma, tal como determinado no seu programa educativo individual”, frisa João Adelino Santos. Na última avaliação que fez à situação do ensino especial nas escolas, datada de 2012/2013, que abrangeu 97 estabelecimentos de ensino com um total de 6566 (4,5%) de alunos sinalizados com NEE, a Inspeção-Geral da Educação e Ciência dava conta de que 30,54% deles têm apoios especializados fora das suas escolas, durante o tempo curricular.
João Adelino Santos apresenta outros exemplos referentes aos alunos com currículo específico individual, a medida adoptada para os casos mais severos, onde se substituem as competências definidas para cada nível de educação para adaptá-las às características e necessidades de cada aluno. Como explica aquele docente, por norma, a partir do 2.º ciclo do ensino básico, “estes alunos frequentam essencialmente as disciplinas de expressões (educação visual; educação tecnológica; educação física; educação musical). Na eventualidade do aluno frequentar apenas educação visual, educação tecnológica, educação musical e educação física, está integrado na turma cerca de 32% do tempo, logo, não dá direito a turma reduzida”.
Considera-se que um aluno tem necessidades educativas especiais quando apresenta dificuldades no processo de aprendizagem e participação, devendo nestes casos ser apoiados pela educação especial. Há as chamadas NEE de carácter temporário, onde se incluem os alunos com problemas ligeiros de desenvolvimento ou de aprendizagem, e as permanentes, onde se incluem os alunos com deficiência mental, com problemas de cegueira e de surdez, entre outros.
Segundo dados provisórios da Direção-Geral de Estatísticas da Educação e Ciência, no presente ano lectivo, o número de alunos sinalizados com NEE que estão a estudar em escolas regulares é de 79.077, tendo aumentado 74% em apenas seis anos.
Máximo continua nos 30
O diploma que estabelece as novas regras para a constituição de turmas é assinado pela secretária de Estado Adjunta e da Educação, Alexandra Leitão, e pelo secretário de Estado da Educação, João Costa. O número máximo de alunos por turma continuará a ser o que foi determinado por Nuno Crato: 25 no pré-escolar; 26 no 1.º ciclo; e 30 nos 2.º e 3º ciclos.
Na semana passada, foram debatidos no Parlamento seis iniciativas legislativas com vista à redução do número de alunos por turma, incluindo uma do PS. Estão agora em discussão na Comissão Parlamentar de Educação, mas a maioria de esquerda no Parlamento já anunciou estar disponível para chegar a um acordo e garantir, assim, a aprovação na Assembleia da República. Na altura, o ministro da Educação, Tiago Brandão Rodrigues, fez saber que faria esta redução “paulatinamente”.
Para o diploma publicado nesta quinta-feira em DR não foi ouvida nenhuma das entidades previstas na lei. O ME justifica esta ausência com o facto de tal audição só permitir a conclusão do diploma no final de Maio, o que comprometeria a sua execução.
Notícia actualizada às 20h10. Acrescenta esclarecimento do Ministério da Educação
In Publico, 15/04/2016
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