quarta-feira, 17 de agosto de 2016

Lugares públicos - um grande desafio

Eu não sei bem dizer porque, mas nunca gostei de levar Guilherme quando bebê a lugares barulhentos ou com muita gente. É fácil concluir que como ele teve muitos problemas ao nascer eu queria o proteger, mas não era isso, meu sexto sentido de mãe me dizia que ele não gostava. E eu sempre segui minha intuição, principalmente em se tratando do meu filho.
Logo que o autismo começou a se manifestar, esse desgosto por ambientes barulhentos e lotados foi ficando cada vez mais nítido na vida do Gui. Se eu o colocasse a frente dessas situações ele entrava em desespero, gritava, chorava, se debatia. Era impossível entrar em uma loja, restaurante, shopping, comprar qualquer tipo de coisa com ele junto. Quem visse poderia dizer que ele estava fazendo birra, mas eu nunca achei que fosse birra e nem tampouco ignorei. Sempre protegi meu filho e sempre fiz questão de mostrar a  ele que eu estava ao seu lado independentemente do que acontecesse.
Existe uma teoria que diz que quanto mais expusermos nossos filhos autistas àquilo que lhes causa desconforto melhor será para eles acostumarem. Eu discordo disso com todas as minhas forças. Dessa forma o seu filho pode ate aprender a concordar com você, mas ele não estará feliz. Ele estará sofrendo e com um problema que não foi resolvido, assim como uma torneira pingando em que a pessoa vai lá e amarra um pano, ela não para de pingar, apenas diminuiu a velocidade da goteira. Forçar um autista a estar aonde não quer gera um sofrimento muito grande. Eles precisam ser conquistados e os problemas precisam ser superados com paciência e amor.
Eu sei que todos nós temos uma vida e queremos aproveitar ao máximo, mas o que será de nossa vida se não tivermos pelo menos a esperança de vermos nossos filhos felizes? Conheço diversas técnicas utilizadas para desenvolvimento de autistas, mas eu escolhi o caminho mais difícil, porém o mais duradouro e o que mais me da a garantia de que mesmo que eu deixe de viver algumas coisas, meu filho está cada vez vivendo melhor. Eu escolhi entrar no mundo dele, conquista-lo e só depois de alguns anos tentar levar uma vida normal com ele.                                                                                           
Minha entrega foi total, eu nunca o deixei desistir, mas quando tentávamos alguma experiência nova em lugares públicos eu dizia que mesmo se ele não conseguisse eu iria o amar igual, que de tanto tentar ele iria conseguir com o tempo. Foram inúmeras tentativas que terminavam em choros, gritos, crises que duravam dias para passar... Eu não me entregava, mesmo sozinha, com vontade de chorar e desmontar ali mesmo eu o segurava forte e o protegia e então combinávamos de tentar de novo, acabava em gritos de novo, aquilo parecia não ter fim... Nunca liguei para olhares maldosos, estava mais preocupada com o meu filho do que com as outras pessoas. Com o passar dos anos ele se superou e eu também aprendi a decifrar o que da e o que não da para fazer com ele.

É importante entender que dentro do funcionamento do autismo existem coisas que eles realmente não se sentem bem em fazer, é hora de pensar se aquele tão sonhado lugar ou aquela tão amada visita é realmente importante para nossos filhos ou é mais um desejo nosso do que deles? Muitas pessoas podem me questionar alegando que tem o direito de viver e ter seus próprios sonhos. Sim. Nós temos, mas podemos fazer isso de diversas formas, para mim a felicidade do meu filho é e sempre será prioridade, independe do que eu tenho que abrir mão para vê-lo feliz. Conquistando a confiança dele podemos conquistar o que quisermos, tem sido assim desde que descobri o autismo.

Nunca mais havíamos sido expostos a uma situação de surpresa...

Mas hoje aconteceu uma experiência interessante. Guilherme queria ir a uma pizzaria. Saímos do hotel em que estamos hospedados e escolhemos um restaurante que achamos que ele iria gostar. Chegando lá tinha muito barulho e era escuro o ambiente. Gui estava de mãos dadas comigo, senti sua mão tremer, vi seu olhar se perder, ele se sentou e olhou para o infinito, percebi que estava prestes a se desorganizar. Chamei ele e perguntei se ele queria ir embora, ele só conseguiu sinalizar com a cabeça que sim. Saímos com ele, achamos uma outra pizzaria, bem humilde, porém ampla e iluminada, ele sinalizou que estava bom ali. Seu olhar continuou perdido durante todo o jantar, mas conseguiu comer e pediu para ir embora quando cansou. No carro ele me chamou e me disse: "mamãe, eu te amo, já estou melhor". Me controlei para não chorar, de emoção, de alegria, de sentimento por ele, mas principalmente por gratidão a Deus em sempre me orientar a fazer a melhor escolha.
Quando estávamos voltando em direção ao carro o funcionário do primeiro restaurante nos viu e abençoou Guilherme lhe desejando muita felicidade em sua vida. Gui, no meu colo, sorriu, agradeceu e com calma disse que iria voltar para o hotel. Olhei para trás e vi aquele homem emocionado, nos abanando e tive a mais bela recompensa, aquela que vale muito mais do que um elegante jantar, a alegria do meu filho e a manifestação de Deus através de pessoas que sabem o verdadeiro valor que a vida tem.
Beijos cheios de luz e paz. Mamãe.
facebook/kenyatldiehl

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