quinta-feira, 10 de outubro de 2019

Decreto-Lei n.º 54/2018, de 6 de Julho: um ano passado, um ano perdido?

As ambiguidades contidas no diploma parecem actuar como um travão ao sucesso educativo dos alunos com NEE.

Em primeiro lugar, gostaria de esclarecer que este artigo não pretende tratar um conjunto de argumentos contra a inclusão de alunos com necessidades educativas especiais (NEE) nas escolas regulares e, muito menos, contra a sua exclusão dessas mesmas escolas. Pretende, sim, apresentar alguns considerandos com base na minha apreciação do Decreto-Lei n.º 54/2018, de 6 de Julho, passado que foi um ano da sua entrada em vigor. Graves, direi, por subestimarem os direitos dos alunos com NEE. Por lançarem uma confusão generalizada no que respeita a conceitos (de inclusão, por exemplo). Por discriminarem contra a maioria dos alunos com NEE (à excepção de alunos com problemas sensoriais), desconsiderando a categorização. Por fazerem apelo a processos ineficazes de atendimento às necessidades dos alunos com NEE (ver DL 54/2018, Capítulo II). Por criarem centros de apoio à aprendizagem cujo objectivo é nebuloso (ver Artigo 13.º). Pela falta de preparação (e de tempo) de muitos professores para cumprirem o que lhes é solicitado com base no preceituado no Decreto-Lei. Pelo financiamento exíguo que impede o bom funcionamento das escolas no que concerne à construção de respostas educativas eficazes para os alunos com NEE (e, com certeza, para todos os alunos). Enfim, pelo preconizado no Decreto-Lei negligenciar, na generalidade, a educação de crianças e adolescentes com NEE ao ponto de poder vir a comprometer o seu futuro.

Começo pelo conceito de inclusão que parece não ter sido bem entendido pelos mentores do Decreto-Lei (leia-se, Ministério da Educação). Compreender o conceito de Inclusão não é fácil, pois ele é, na maioria dos casos, vagamente definido ou nem sequer o é (caso do Decreto-Lei). Para compreendermos o significado de inclusão (educacional, neste caso), é preciso que compreendamos o conceito de diversidade, ou seja, que compreendamos as diferenças intrínsecas ao conceito de diversidade. Assim, ao falarmos de inclusão educacional estamo-nos a referir a um tipo específico de diversidade que deve receber uma atenção “especial” por parte de professores e de outros agentes educativos nos vários contextos escolares onde os alunos com NEE se movem. Contudo, o ME parece não ter percebido a noção de que não se deve comparar diversidade de capacidades e necessidades, neste caso relacionadas com a educação, com a diversidade que se prende, por exemplo, com a altura dos seres humanos, a cor da pele, a religião e a nacionalidade. Ou seja, no caso do preceituado no DL 54/2018, os seus mentores, defensores da inclusão total, fazem-nos crer que todas as diversidades exigem a mesma resposta, cometendo o erro de não entender que, em educação, há uma muito maior variabilidade ou diversidade entre as necessidades educacionais dos alunos com NEE. Que a diversidade que diz respeito à inclusão educacional destes alunos, particularmente dos alunos com NEE significativas, exige também uma “diversidade” de práticas educacionais, tantas vezes em contextos educacionais distintos, sendo o contexto de sala de aula (classe regular) o desejável.

In O Público
Artigo na íntegra AQUI

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