Nem tudo
o que mexe é hiperativo, nem todos os que sonham têm défice de atenção. Mas
destruir um fármaco com “cultura de facebook” é demasiadamente leviano
Houve um
aumento na prescrição de metilfenidato para o dobro, entre 2010 e 2014. Podem
existir várias explicações, desde exagero de prescrições até melhor diagnóstico
e medicação de crianças e jovens que necessitavam mas não o estavam a tomar.
Por outro lado, o melhor conhecimento dos problemas de dispersão, falta de
concentração e atenção, e de hiperatividade pode justificar o aumento.
Especulação à parte, o que se sabe, sim, é que embora haja crianças medicadas
inutilmente, é grande o número das que precisam e não estão medicadas e, entre
as que estão, a esmagadora maioria colhe benefícios.
Recomenda-se
este fármaco quando há uma perturbação da concentração e atenção que afete a
vida das crianças de forma significativa, para lá do normal cansaço, má gestão
dos estímulos artificiais que desviam a atenção ou da irrequietude natural das
crianças e jovens, sobretudo do sexo masculino. Nem tudo o que mexe é
hiperativo, nem todos os que sonham têm défice de atenção! As crianças, vivendo
num mundo “entre quatro paredes”, precisam de se expandir, de se mexer. No
entanto, a incapacidade de concentração num estímulo, sobretudo abstrato,
desviando--se para “qualquer mosca que passe” faz com que a criança retire
muito pouco das aulas, se sinta mais distante do “filme” que está a passar na
sala de aula e invente outras coisas, mexendo-se, perturbe os outros e se
comporte de modo hiperativo, sendo disruptivo para a aula e prejudicando
gravemente o seu próprio processo de aprendizagem, ou então mergulhe na sua
vida interior e se abstraia. Acresce que estar constantemente a ser admoestado
e de castigo, ver as notas aquém do que sabe ser possível, ler apenas metade do
cabeçalho e responder impulsivamente de modo incompleto, diminuem a autoestima,
causam tristeza e geram problemas sociais e psicológicos.
Os benefícios da terapêutica, que pode ser instituída por um pediatra ou neuropediatra e que não necessita de ser baseada em testes e exames, vão ajudar o processo de aprendizagem e permitir à criança o desenvolvimento das suas capacidades.
Os benefícios da terapêutica, que pode ser instituída por um pediatra ou neuropediatra e que não necessita de ser baseada em testes e exames, vão ajudar o processo de aprendizagem e permitir à criança o desenvolvimento das suas capacidades.
O
argumento de que “é um químico” é anedótico porque o cérebro funciona,
exatamente, com mediadores químicos, e nos casos de hiperatividade e défice de
atenção, dispersão e impulsividade, esse mediador está em falta. Com o
crescimento o cérebro arranjará outras formas de funcionamento e não é precisa
medicação para a vida toda, como alguns ignorantes dizem. Além disso, é boa
prática as crianças interromperem a medicação nas férias letivas; a ideia de
que se fica “preso a uma droga” é mais um dos mitos urbanos veiculados na
Internet.
Quanto a contraindicações, nas redes sociais há pessoas que gostam muito de dizer que “é veneno”. Dá vontade de rir – leiam a bula do ibuprofeno ou do paracetamol, que dão aos vossos filhos e verão a “galeria de horrores”. Com o metilfenidato os efeitos colaterais são raros e, salvo exceções, resumem-se a situações transitórias e breves de baixa de apetite ou pequenas insónias.
Quanto a contraindicações, nas redes sociais há pessoas que gostam muito de dizer que “é veneno”. Dá vontade de rir – leiam a bula do ibuprofeno ou do paracetamol, que dão aos vossos filhos e verão a “galeria de horrores”. Com o metilfenidato os efeitos colaterais são raros e, salvo exceções, resumem-se a situações transitórias e breves de baixa de apetite ou pequenas insónias.
O
metilfenidato não dá “superpoderes”, apenas faz render melhor as capacidades
naturais a estas crianças. Não ficarão engenheiros, pianistas ou escritores com
o medicamento se não tiverem esses talentos, mas podem nunca vir a ser
engenheiros, escritores ou pianistas, tendo esses talentos, por não conseguirem
estudar, concentrar-se e andarem toda a escolaridade a saltitar de “mosca para
mosca”, irritando os professores, enervando os pais e diminuindo a sua
autoestima. E se pensássemos numa coisa chamada Ciência? Talvez valha mais do
que o diz-que-diz das redes sociais…
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http://www.paisefilhos.pt
Mário Cordeiro, pediatra, Fevereiro 2017
Mário Cordeiro, pediatra, Fevereiro 2017
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